quarta-feira, 21 de abril de 2010

Pedaladas de ouro


Ufa, minha reportagem finalmente está pronta :)
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Pedaladas de ouro
Conheça os protagonistas do esporte que já levou Cascavel e o Brasil ao lugar mais alto do pódio várias vezes.


O ciclismo tem a sua origem em uma corrida no mínimo curiosa. Em 1842, um dos inventores da bicicleta, o escocês Kirk Patrick MacMillan, apostou uma corrida com um cocheiro. MacMillan acreditava que sua invenção era capaz de percorrer 154 km - de Glasgow à Carlisle, na Escócia - mais depressa do que a carruagem. Ele estava certo.

Desde então, a bicicleta evoluiu, e muito. Hoje o equipamento com todos os aparatos necessários para a prática profissional do esporte pode custar até 12 mil reais! Isso por que é uma bicicleta projetada para competições e, portanto, precisa ser leve, firme e resistente à força e ao impacto. O preço justifica-se pelo material: fibra de carbono trançada, a mesma matéria-prima utilizada pelos carros da Fórmula 1. Aliás, essa é, infelizmente, a única semelhança entre esses dois esportes. Após mais de um século e meio de história, o ciclismo ainda clama por mais incentivos.

Mesmo com algumas pedras e buracos no caminho das bicicletas, Cascavel é a casa do protagonista de uma trajetória cheia de pódios no ciclismo. Jovem, recém saído do Exército Militar e com formação para o exercício da profissão de torneiro mecânico, ele nem imaginava que chegaria tão longe. Deu as primeiras pedaladas profissionais aos 19 anos, competindo e ganhando nas etapas regionais do Campeonato Paranaense. No ano seguinte, 1998, integrou a equipe principal de Cascavel e ajudou na conquista dos Jogos Abertos. Vitórias foram se seguindo e o destino parecia certo: em breve seria reconhecido! O destino, de fato, se cumpriu, mas não foi nada fácil.

No ano de 2000, ele quis abandonar a carreira. Faltavam patrocínios. Nessa hora apareceu seu “anjo da guarda”: um amigo empresário, que acreditou no seu trabalho e custeou seus gastos com passagem e hospedagem até São Paulo, onde morava a esperança do reconhecimento profissional. Agora a receita estava completa, com todos os ingredientes necessários para o sucesso de um ciclista: garra, determinação, perseverança e incentivo. O resultado não poderia ser diferente. Em 2001 ele fechou um contrato com a equipe de Santos e em 2005 passou a integrar a equipe de São José dos Campos. Hoje ele faz parte da primeira equipe profissional de ciclismo do Brasil e é conhecido mundialmente pelo apelido “The Flash”, – uma referência ao herói das histórias em quadrinho mais rápido do mundo - aquele que vem quietinho, escondido, mas passa tão rápido pelos adversários que eles nem ao menos conseguem ver.

Eles são os integrantes mais jovens da equipe de ciclismo Juventus/Semel de Cascavel. Um tem apenas 13 anos e o outro 15. Os pais, que também pedalam, foram a referência para iniciarem nesse esporte. Sentem dificuldades quanto ao preparo físico, afinal, pedalar 120 quilômetros por semana não é pra qualquer um. Fora dos treinos eles levam uma vida normal para os garotos da idade deles: se preocupam em tirar boas notas no colégio, jogam futebol e fazem curso de informática. Isso sem descuidar da alimentação. São meninos sonhadores e decididos: “quero ganhar as competições, ter um nome no ciclismo”. Em relação ao patrocínio eles são otimistas. “Está bem até. A Prefeitura está ajudando, dando os uniformes. Estou achando legal pra um esporte que não é tão reconhecido no Paraná.”

Eles têm razão. Apenas a Prefeitura, através da Secretaria de Esportes e Lazer (Semel) tem incentivado a prática do ciclismo na nossa cidade. Dário Delai é técnico da equipe Juventus/Semel há mais de dez anos e diz que não há interesse por parte das grandes empresas da região em patrocinar esses atletas. O apoio que a equipe recebe do Município é fundamental, mas ainda não é o bastante. “É um apoio para pagar a inscrição, o transporte e a alimentação. Os atletas que se destacam nas competições recebem uma ajuda de custo. Para nossa equipe despontar e aparecer nacionalmente nós precisaríamos receber três vezes o valor que recebemos hoje”.
 
Ele é Nilceu Aparecido dos Santos, 32 anos, cascavelense de coração e consagrado ciclista com mais de 80 grandes títulos na carreira. Só para citar alguns: campeão da 9 de Julho (2001), campeão do Meeting Internacional de Goiânia (2004), campeão por equipe do 20º Tour de Santa Catarina (2006), campeão da Copa da República (2007), campeão Brasileiro de Resistência (2007) e tetracampeão da Copa América de Ciclismo (2005, 2006, 2007 e 2008) – sendo a prova de 2005 a mais marcante na carreira de Nilceu. Ele conta como foi: “a competição estava se encadeando para um argentino vencer a prova. Ele estava nos últimos 800 metros e tinha 150 metros de vantagem. Ninguém do pelotão de trás acreditava que poderia alcançá-lo, mas eu acreditei. Fui perseguindo ele e nos 20 metros finais da prova eu consegui a ultrapassagem. Foi uma prova emocionante por que atletas antigos, de 50 anos atrás, que estavam assistindo a competição me falaram que nunca tinham visto uma coisa igual na vida”.


Eles são Gabriel Amâncio, 13 anos e Matheus Goebel, 15 anos. Apesar da pouca idade eles também já têm boas histórias para contar. Gabriel já treina há três anos e em 2009, conquistou o 4º lugar na 3ª Etapa do Campeonato Paranaense de Ciclismo de Ponta Grossa. Ainda no mesmo ano o garoto “prodígio” ficou com o 2º lugar na Etapa Final do Campeonato Regional de Montain Bike e o 2º lugar geral na Copa Oeste de Ciclismo.




Matheus também já subiu ao pódio. No ano passado ele garantiu o 3º lugar no Duathlon Terrestre de Cascavel, prova que o impulsionou no ciclismo. “Eu me interessei mais pelo ciclismo quando pratiquei minha primeira prova de Duathlon Terrestre, onde eu percebi que no ciclismo eu ganhei posições e acabei subindo ao pódio.” Matheus também já competiu no Campeonato Regional e apesar de não ter figurado entre os primeiros colocados ficou feliz com o resultado. “Fiquei lá atrás, mas está bom pra um iniciante”.



Mesmo com histórias, conquistas e dificuldades diferentes estes três personagens estão ligados por um sentimento comum: a paixão pelas pedaladas e a vontade de viver desse esporte. Infelizmente, isso não é suficiente para levá-los ao alto dos pódios. Apesar de não ser encarado (ainda) como um empecilho pelos meninos Gabriel e Matheus, a falta de patrocínio resulta em uma ausência de participação nas competições e sem isso o atleta não consegue se destacar. E quem diz isso não sou eu, mas sim “a voz da experiência” nesse assunto, Nilceu dos Santos. Ele ainda aponta uma possível solução: “em São Paulo todos os esportes vão pra frente porque lá as empresas que estão lícitas ao invés de destinar 1% do incentivo fiscal para o governo, elas pegam essa quantia e investem em algum esporte, adotam um esporte. Tem muita empresa grande aqui da região que podia fazer o mesmo. Eles só vão ter vantagens, por que a marca deles vai ser divulgada em vários meios de comunicação”. Essa é uma solução irritantemente fácil e simples! Cascavel não pode se limitar a ser a região do agro-negócio. Nossa terra é muito fértil e também dá vários outros frutos maravilhosos, que não devemos esquecer de cultivar.

Além da questão financeira, o ciclismo da região Oeste do Paraná parece enfrentar uma outra (e grande) dificuldade: uma espécie de preconceito com aqueles do interior. Apesar de ter alcançado o patamar mais alto do ciclismo nacional, “The Flash” ainda se sente esquecido. “A minha maior frustração é ter me dedicado todo esse tempo ao ciclismo (mais de 13 anos), com o currículo invejável que eu tenho e nunca ter participado de uma seleção para os Jogos Pan-americanos, Sul Americanos ou para um Mundial. Todo atleta tem o sonho de participar de uma Olimpíada. Não sonhamos nem em ganhar, mas só em estar lá e ser um atleta olímpico. Eu tive todo o potencial para isso. Em 2007 eu era o melhor do ranking, tinha ganhado sete competições até o Pan-americano e não participei do Pan do Brasil. Isso aí, às vezes, é desanimante. O atleta luta a vida inteira para chegar ao nível mais alto e não consegue representar o país.”

O que poderia ter motivado este fato? Deixar de lado um “monstro” do ciclismo, que com certeza traria inúmeras alegrias para toda uma nação que se nutre de esportes me parece algo impensado. Talvez falte uma percepção maior do que é esse esporte, de como os atletas se sacrificam em busca de bons resultados. É um trabalho de domingo a domingo, incluindo os feriados. São centenas (eu disse CENTENAS) de quilômetros pedalados toda semana, no menor tempo possível. A alimentação precisa ser rigorosamente controlada: rica em carboidratos e proteínas e evitando ao máximo as frituras. Sabe aquele prato suculento de batata frita com bife? Está totalmente fora do cardápio! Uma visita diária à academia para algumas horas de musculação também é necessária. Festas? Nem pensar! O corpo precisa de um tempo para se recuperar da intensa rotina de exercícios e esse tempo não pode ser gasto nas “noitadas”.

Esses atletas, muitos deles ainda meninos, têm dedicação exclusiva ao ciclismo e fazem isso simplesmente por amor! E sabe quais são as únicas coisas que eles realmente precisam para seguirem firmes nessa luta? A torcida, a vibração e o carinho das pessoas. Para eles, as dificuldades físicas e a falta de patrocínio são as coisas menos preocupantes. Precisamos aprender a reconhecer os verdadeiros heróis brasileiros, aqueles que superam o sofrimento e o cansaço inexplicáveis durante uma prova, vencendo chuva, sol, frio, descidas, subidas ou qualquer outro obstáculo que possa aparecer em seu caminho, com o desejo ardente de subir no lugar mais alto do pódio, carregando consigo toda uma cidade, um estado ou um país.

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